02. O BUDA DO RIACHO

Uma história de compaixão radical que desafiou o sistema e as convenções sociais.

Do livro de Contos – O Andarilho – Histórias de Criança para Transformar Adultos – de Alexandre Viana

INTRODUÇÃO:

UM DESCONHECIDO FEZ O IMPENSÁVEL
É UM CHOQUE DE REALIDADE
O QUE VOCÊ TERIA FEITO NO LUGAR DAQUELES BOMBEIROS?

O BUDA DO RIACHO

Uma história de compaixão radical que desafiou o sistema e as convenções sociais.

O ENGANO NECESSÁRIO

A chuva caía sem parar. Grossas gotas prateadas batiam no asfalto. Transformavam as ruas estreitas da periferia em rios revoltos. O vento uivava entre os prédios. Fazia as árvores se curvarem.

Nesse cenário, uma figura solitária dirigia com calma. As mãos pousadas no volante eram finas. Mas firmes. Os olhos, amendoados e profundos, refletiam uma serenidade incomum.

De repente, um som cortou o barulho da tempestade. Ganidos desesperados. Choramingos agudos. Vinham do antigo riacho. Agora era apenas um canal de esgoto transbordante.

A figura estacionou bruscamente. Saltou do carro sem se preocupar com a chuva. Observou a cena. Dois vira-latas lutavam contra a correnteza. Suas patas escorregavam nas pedras lisas. Seus corpos pequenos já quase desapareciam na água escura.

Sem hesitar, as mãos finas discaram o número de emergência. “Corpo de Bombeiros? Dois indivíduos estão se afogando no canal da Rua das Flores! Venham rápido!” A voz era suave. Mas urgente. As mãos tremiam levemente ao desligar. O detalhe crucial ficara de fora. De propósito.

A REVELAÇÃO E A FÚRIA

Precisamente quatro minutos e trinta e sete segundos depois, a sirene ecoou. OS BOMBEIROS chegaram em tempo recorde. O caminhão vermelho parou com um rangido. O capitão saltou antes mesmo de parar completamente.

Era um homem robusto. Ombro largos sob o uniforme encharcado. Seu rosto marcado pela fadiga mostrava anos de serviço. Os olhos azuis, normalmente firmes, agora estavam cheios de urgência.

“Onde estão os afogados?”, gritou enquanto ajustava o colete salva-vidas. Sua voz grave ecoou na chuva.

“Lá! Presos na tubulação!”, respondeu a figura misteriosa. Agora percebia-se que era uma mulher. Magra. Vestindo roupas simples e uma capa molhada. Seus cabelos curtos grudavam no rosto compassivo. Mas havia algo nela. Uma aura. Uma presença.

Os holofotes do caminhão iluminaram o canal. A luz amarela revelou a verdade. Dois cachorros de rua pelos emaranhados, pequenos e impotentes ante ao dilúvio. Seus olhos brilhavam de medo.

“Puxa vida! São só dois cachorros perdidos!”, o capitão deixou o colete escorregar de suas mãos calejadas. Seu rosto se transformou. Da preocupação para a frustração ele concluiu. “Você nos fez correr por isso?”

Resignada diante a situação, O BUDA DO RIACHO não se moveu. A chuva escorria por seu rosto sereno. “Dois seres vivos estão morrendo. Cabe ao salvador escolher quem merece viver?” Sua voz era suave. Mas firme.

O DEBATE QUE ACENDEU A CHAMA

O BOMBEIRO mais novo interveio. Era um rapaz alto. Cabelos loiros escorridos pela chuva. Seu rosto juvenil estava vermelho de raiva, quando concluiu indignado: “Isso é um absurdo! Gastamos recursos preciosos! Equipamento caro! Tudo por animais que nem registro têm!”

O BUDA gentil virou-se para ele, lentamente como se estivesse em câmera lenta. Seus olhos escuros pareciam ver através da alma do jovem quando finalmente respondeu. “E se fossem crianças? O que faz uma vida valer mais? O número de pernas? O formato das orelhas? O som da voz?”

O capitão interrompeu com um gesto súbito e brusco. “Chega! Nosso protocolo é claro. Salvamos pessoas. Ponto final.” Ele cruzou os braços. “Para animais, chame o canil.”

Foi então que a calma do BUDA se quebrou. Como uma represa rompida, despejou suas palavras, agora furiosas. “Então hoje vocês aprenderão uma lição!”, sua voz ecoou como um trovão. “Já que recusam salvar dois seres… terão que salvar uma pessoa!”

O SALTO QUE ABALOU AS CONVENÇÕES

Antes que reagissem, ela se lançou nas águas turbulentas. Seu corpo esguio desapareceu na escuridão. Dez segundos passaram. OS BOMBEIROS correram para a margem. Os holofotes varriam as águas revoltas. Nada.

Então, como um milagre, ela emergiu surpreendentemente. Com um cachorro em cada braço. Seus músculos tremiam com o esforço. A água batia em seu queixo.

“Nossa senhora! Ela pegou os cachorros!”, o bombeiro mais novo gritou. Seus olhos estavam arregalados.

O BUDA lutava para manter as cabeças dos frágeis pequenos acima d’água. “Estou me afogando com duas vidas nos braços! Sou uma humana. Cumpram seu dever!”, sua voz agora era um grito rouco e desafiador.

O RESGATE FORÇADO

O capitão olhou para seus homens. Depois para a cena. E em seguida um suspiro profundo escapou de seus lábios. “CORDAS HOMENS! AGORA!”, ordenou porque sabia quais seriam as consequências se não agisse.

As cordas voaram. Laços precisos envolveram o corpo molhado da ousada salvadora. Puxaram. Devagar. Cuidadosamente. Três vidas emergiram das águas escuras.

No chão lamacento, o BUDA FEMININO ainda abraçava os cães. Seus dedos tensos não soltavam. E assim os animais, agora seguros, sacudiam a água, lambendo o rosto da heroína. Seus rabos abanavam fracamente.

O capitão olhou para aquela cena. Seu rosto duro suavizou-se. “Você é uma idealista perigosa”, murmurou. Mas seus olhos não conseguiam desviar dos animais nitidamente gratos. Dos mesmos que seu protocolo dizia não valer o esforço.

A LIÇÃO QUE A CHUVA LAVOU

O BUDA DO RIACHO levantou-se com dificuldade. Seu corpo tremia. Mas sua voz era clara e firme. E então ela disse: “Hoje vocês descobriram algo.” Ela apontou para cada bombeiro. “Toda vida salva preserva nossa luz interna de humanidade.”

A chuva começou a diminuir. Nuvens se abriram. Raios de sol iluminaram a cena. OS BOMBEIROS olharam para suas próprias mãos. As mesmas que hesitaram. Mas que no final agiram.

E assim finalmente entenderam. O valor de uma vida não se mede por espécie. Mas pelo simples fato de existir. Respirar. Sentir.

ALEXANDRE VIANA
“Às vezes, é preciso mergulhar na loucura para provar que a verdadeira sanidade está em amar incondicionalmente.”
25/11/2004

Para minha querida amiga Eliana Malta, um Buda disfarçado de gente, neste mundo caótico, pensando mais nos outros do que em si mesma.

ÚLTIMA REVISÃO:
17/04/2025

CONCLUSÃO

ESTA HISTÓRIA MEXEU COM VOCÊ? VAMOS ESPALHAR ESSA LIÇÃO!

🐾  COMPARTILHE NAS REDES SOCIAIS:
✍️ DEIXE SEU COMENTÁRIO ABAIXO:
📩 QUER MAIS HISTÓRIAS QUE DESAFIAM A FORMA COMO VEMOS O MUNDO?

QUER PUBLICAR SUA HISTÓRIA?

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima